segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Incêndios criminosos em favelas de São Paulo

Provocados pelo grande número de incêndios em favelas e moradias precárias na cidade de São Paulo, entidades e movimentos sociais organizaram um debate na Universidade de São Paulo nesta quarta-feira (10) para discutir o tema e organizar iniciativas de solidariedade às famílias desabrigadas. O jornalista José Arbex Jr. abriu dizendo que “não devemos relacionar este fenômeno nem só a São Paulo nem só ao Brasil. Estamos diante de um processo universal, em que a crise do capital, quanto mais ela se acentua, quanto mais veem que não há saída, mais acontece esta desumanização dos pobres, daqueles que não são consumidores. É uma forma de eliminá-los”.

Arbex, que também é escritor e professor da PUC-SP, foi duro ao falar sobre a aceitação da sociedade diante do discurso da grande mídia. Na ocasião, usou como exemplo a versão de que o incêndio na Favela do Moinho teria iniciado com uma briga entre travestis, fator que o alarmou já que estas são uma das personagens mais atacadas pela mídia e pelo senso comum da sociedade. A versão da mídia, portanto, alimentaria a rejeição da sociedade também às travestis, e facilitaria a incorporação pela classe média paulistana de que os culpados pelos incêndios são os próprios moradores.

“O incêndio da favela não é apenas um fenômeno circunscrito à disputa imobiliária nem à especulação produzida pela Copa do Mundo e pelos Jogos Olímpicos. É também isso, mas é muito mais grave. Porque nos leva a perguntar: como é possível a mídia articular este discurso e não ser atacada? Isso é o grave, pois indica um certo entorpecimento das consciências e uma aceitação passiva desta narrativa”, arrematou o professor.

Morador e liderança da Favela do Moinho, Milton Sales endossou a crítica à mídia ao dizer que “é um bando de pau mandado” dos grandes empresários. Miltão, como é conhecido, afirmou que os valores individualistas, consumistas e violentos transmitidos na televisão brasileira também afetam os moradores de favelas.

Givanildo Manoel, militante do Tribunal Popular, relatou uma série de projetos que estão em curso na cidade e denunciou o episódio ocorrido na Favela do Piolho, onde vários fatores indicam o caráter criminoso dos incêndios. “Essa política só é possível de ser implementada por conta do processo de militarização da cidade”, disse Givanildo em referencia aos militares alocados em quase todas as subprefeituras e à chamada “bancada da bala” recentemente eleita na Câmara dos Vereadores.

As Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) implementadas no Rio de Janeiro reforçam a tese de Givanildo, inclusive por abrirem espaço para empresas na favelas. Em São Paulo, o militante acredita que os projetos imobiliários voltados para as periferias, acompanhados da violenta ação policial, alimentam o setor imobiliário e visam expulsar populações pobres para ainda mais longe do centro da cidade.

O professor do Departamento de História da USP, Jorge Grespan, seguiu na mesma toada e disse que “o fato é que essas áreas precisam ser desocupadas para que o capital financeiro tenha poder de abocanhar pedaços maiores da mais valia”. Grespan relacionou as várias formas de exploração sofridas pelos moradores de favela. “É a exploração tanto pelo patrão como pelo setor financeiro pago pelo patrão”, disse.

Várias intervenções dos estudantes presentes na plateia questionavam como a população poderia reagir diante deste processo de reorganização da cidade que prejudica os mais pobres. Todos os debatedores citaram as dificuldades de organização popular na atual conjuntura, mas endossaram a convocatória das iniciativas já agendadas. No dia 13 está marcado um panelaço às 14 horas em frente à Favela do Moinho, e no dia 1º de dezembro, data de inicio da Lei Geral da Copa, deverão ocorrer novas manifestações.

http://www.cartamaior.com.br/template/materiaMostrar.cfm?materia_id=21059

Nenhum comentário:

Postar um comentário