segunda-feira, 30 de julho de 2012

A Reforma Agrária – Uma reflexão!


Observando alguns livros de estudo de Direito Constitucional, destaco um pequeno trecho que diz que a propriedade atenderá a sua função social, porém ressalva que o fato da mesma não cumprir dita função não autoriza qualquer tipo de intervenção que não seja constitucionalmente fundamentada, tais como invasões de terra por movimentos sociais organizados, ainda que a pretexto de promover a reforma agrária. Cita precedente do Supremo Tribunal Federal!
 Francamente! São inúmeros livros e mais livros acadêmicos e muitos ainda continuam com uma linguagem meramente narrativa. Preocupam-se sempre em narrar uma informação já construída, sem o ideal da formação crítica do educando. Segundo o educador Paulo Freire (Pedagogia do Oprimido, editora Paz e Terra, 41ª ed., p. 66), “uma das características dessa educação dissertadora é a “sonoridade” da palavra e não sua força transformadora”.
 Pois bem! Vamos então à tal propriedade e à Reforma Agrária! Estamos em pleno 2012, mais de 500 anos desde a ocupação colonizadora em nosso país. Extinguiu-se um grupo humano numeroso e valioso (os índios); quando não, foram tiradas as suas terras. Passou-se a explorar a terra das piores formas possíveis, até os dias atuais. Há quem diga que a exploração famigerada de cana de açúcar no Nordeste é saudável? (ou foi!!!). Uma monocultura barata, de lucro centralizado, que empobreceu o nosso solo.
 Só isso? Não! Também abolimos a escravatura através de lei Áurea (como se liberdade não fosse um direito natural, tendo que ser reconhecida por lei), mas deixaram os seus vestígios (o que diga o emprego doméstico e os seus poucos direitos trabalhistas e o trabalho escravo, tipificado este como crime no Código Penal). Alforriaram-se os negros, porém sem a reforma agrária!
 A terra bem que deu os seus gritos: Foram Arraial de Canudos, Ligas Camponesas, Movimentos pela luta da terra... mortes e mais mortes; violência e carnificina: Do massacre de Canudos ao do Eldorado dos Carajás!!!
 E eu com isso? Bom, o art. 5 da Constituição Federal de 1988 é claro: “Todos são IGUAIS (será mesmo???) perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (será????), garantindo-se aos brasileiros (...) a inviolabilidade do direito à propriedade (falei PROPRIEDADE) (...)” (grifo e comentário meu).
 Agora “Zezinho”, meu aluno favorito me pergunta: Professor, se todos são iguais, se não deve haver a distinção de qualquer natureza, se a propriedade é um direito fundamental, por que então tantos nascem e continuam até morrer, sem terra alguma?
 E eu digo o quê? Que é assim mesmo, que o Supremo Tribunal Federal é a nossa corte máxima e entende dessa forma, passando assim ao próximo assunto, ou então “esquece isso Zezinho, isto não vai cair na prova do concurso público. Você está perdendo seu tempo!” Devo dizer isto? Afinal, todos são iguais?
 Será que estou regredindo? Não podemos ser domesticados para engolir farsas, mas sim educados para entender que toda a forma de violência e agressividade devem ser rejeitados; que para garantirmos nossos direitos temos que lutar; que os movimentos sociais invadem terras no país, porque a Reforma Agrária é lenta, não anda, a legislação inventou inúmeras etapas, tornando complexo; porque não há vontade real de todos.
 Estamos em 2012 e as pessoas ainda (PASMEM!) estão lutando por terra; os que conseguem acabam tornando-se agricultores de subsistência. Sabe o que é isso? É plantar e colher para comer e sobreviver... apenas sobreviver! E isto é vida??? Pensem bem se estou sendo radical ou me negando a ser mais um cego na multidão.
 Não quero ver ocupações; o conflito por terras traz danos, não à propriedade, mas sim à vida; companheiros morrem; outros seres humanos, nossos irmãos; pessoas pacíficas, famílias humildes. Ou alguém acha razoável um numeroso grupo de famílias enfrentando pessoas armadas, ordens de reintegração e policiais? Lutam para serem iguais, com saúde, crianças na escola, direitos e mais direitos.
 Mas também não quero (acredito que ninguém quer!) ver outros seres humanos morando em praças, em faixas de domínio, na rua, sujeitos a toda forma de violência. Quando não organizados nos Movimentos Rurais, acabam ocupando as favelas das cidades, passando todo tipo de necessidade, fome e miséria. Há ainda os que se entregam às drogas, ao crime ou se humilham ao troco de esmolas.
 Meus amigos pensem bem! O que você faria se tivesse numa situação tão caótica, sem terra, sem saúde básica, com uma escola ruim para os seus filhos, sem emprego, não sabendo o que fazer no dia de amanhã, vendo seus filhos e sua família numa situação de marginalização??? Um certo amigo disse-me que não suportaria ver o filho passando necessidade! E alguém suporta ver pessoas, que gostamos tanto, sofrendo?
 Não vou basear meus argumentos em acusações aos líderes dos sem terras ou em factóides. Eu garanto que a maioria de meus colegas de trabalho pensa na paz social; na solução pacífica dos conflitos; na solução em que a VIDA esteja acima de tudo.
 A nossa Presidente deve liderar a Reforma Agrária e em tempo curto. Deve negociar com o judiciário, através de seus órgãos e do CNJ a construção de metas de julgamento; deve agilizar as Reformas e dinamizar a atuação do Incra; deve prestar contas à população e chancelar a transparência dessas atividades aos Movimentos Rurais interessados.
 A Constituição Federal de 1988 é uma lei belíssima! Se a propriedade foi escrita neste texto para garantir os interesses da bancada dos grandes ruralistas, deve-se lembrar da máxima de que a lei não tem dono e, uma vez saindo do Legislativo, pode ser interpretada de acordo com os princípios. Assim, se os trabalhadores sem terra não tiveram representantes na Assembléia Constituinte, isto não quer dizer que os seus direitos não possam ser devidamente assegurados, afinal “TODOS SÃO IGUAIS!
 A vida é para ser vivida em paz e com amor! Não acredito que vamos continuar excluindo nossos companheiros de jornada, cegos por um sistema econômico, criado por nós mesmos, que valoriza o nosso pior lado: o egoísmo, a soberba e a inveja. A terra produz trabalho e isto é riqueza!
 Os filhos dos tantos “Josés” e “Marias” nascem sem terra alguma, enquanto que o filho do barão moderno vem ao mundo rico de berço, com terras abundantes, do tamanho de cidades. Há alguma lógica racional ou cristã nisto?
 Se existem ocupações e conflitos é porque não se está distribuindo as terras e ainda quando acontece, não se é em prazo curto. Vamos dividir o que temos, ainda mais quando se tem de sobra e abundância: terra!
 “Ocupar, resistir e conquistar”! Este não é um lema apenas de sem terra e sim de toda mulher e homem de bem que reconhece que só a luta muda a vida e que apenas a luta dos trabalhadores de todo o país faz acontecer.
 Ah! A propósito do título deste texto, pense bem: Todos são iguais!!! (não mais uma pergunta, mas sim uma afirmação).
  
Antônio José de Carvalho Araújo
Juiz Federal e Professor de Direito Constitucional

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