Observando
alguns livros de estudo de Direito Constitucional, destaco um pequeno trecho
que diz que a propriedade atenderá a sua função social, porém ressalva que o
fato da mesma não cumprir dita função não autoriza qualquer tipo de intervenção
que não seja constitucionalmente fundamentada, tais como invasões de terra por
movimentos sociais organizados, ainda que a pretexto de promover a reforma agrária.
Cita precedente do Supremo Tribunal Federal!
Francamente! São inúmeros livros e mais
livros acadêmicos e muitos ainda continuam com uma linguagem meramente
narrativa. Preocupam-se sempre em narrar uma informação já construída, sem o
ideal da formação crítica do educando. Segundo o educador Paulo Freire
(Pedagogia do Oprimido, editora Paz e Terra, 41ª ed., p. 66), “uma das
características dessa educação dissertadora é a “sonoridade” da palavra e não
sua força transformadora”.
Pois bem! Vamos então à tal propriedade
e à Reforma Agrária! Estamos em pleno 2012, mais de 500 anos desde a ocupação
colonizadora em nosso país. Extinguiu-se um grupo humano numeroso e valioso (os
índios); quando não, foram tiradas as suas terras. Passou-se a explorar a terra
das piores formas possíveis, até os dias atuais. Há quem diga que a exploração
famigerada de cana de açúcar no Nordeste é saudável? (ou foi!!!). Uma monocultura
barata, de lucro centralizado, que empobreceu o nosso solo.
Só isso? Não! Também abolimos a
escravatura através de lei Áurea (como se liberdade não fosse um direito
natural, tendo que ser reconhecida por lei), mas deixaram os seus vestígios (o
que diga o emprego doméstico e os seus poucos direitos trabalhistas e o
trabalho escravo, tipificado este como crime no Código Penal). Alforriaram-se os
negros, porém sem a reforma agrária!
A terra bem
que deu os seus gritos: Foram Arraial de Canudos, Ligas Camponesas, Movimentos
pela luta da terra... mortes e mais mortes; violência e carnificina: Do
massacre de Canudos ao do Eldorado dos Carajás!!!
E eu com isso? Bom, o art. 5 da
Constituição Federal de 1988 é claro: “Todos são IGUAIS (será mesmo???) perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza (será????), garantindo-se aos brasileiros (...) a
inviolabilidade do direito à propriedade
(falei PROPRIEDADE) (...)” (grifo e comentário meu).
Agora
“Zezinho”, meu aluno favorito me pergunta: Professor, se todos são iguais, se
não deve haver a distinção de qualquer natureza, se a propriedade é um direito
fundamental, por que então tantos nascem e continuam até morrer, sem terra
alguma?
E eu digo o quê? Que é assim mesmo, que
o Supremo Tribunal Federal é a nossa corte máxima e entende dessa forma,
passando assim ao próximo assunto, ou então “esquece isso Zezinho, isto não vai
cair na prova do concurso público. Você está perdendo seu tempo!” Devo dizer
isto? Afinal, todos são iguais?
Será que estou regredindo? Não podemos
ser domesticados para engolir farsas, mas sim educados para entender que toda a
forma de violência e agressividade devem ser rejeitados; que para garantirmos
nossos direitos temos que lutar; que os movimentos sociais invadem terras no
país, porque a Reforma Agrária é lenta, não anda, a legislação inventou
inúmeras etapas, tornando complexo; porque não há vontade real de todos.
Estamos em
2012 e as pessoas ainda (PASMEM!)
estão lutando por terra; os que conseguem acabam tornando-se agricultores de
subsistência. Sabe o que é isso? É plantar e colher para comer e sobreviver... apenas sobreviver! E isto é vida???
Pensem bem se estou sendo radical ou me negando a ser mais um cego na multidão.
Não quero ver
ocupações; o conflito por terras traz danos, não à propriedade, mas sim à vida;
companheiros morrem; outros seres humanos, nossos irmãos; pessoas pacíficas,
famílias humildes. Ou alguém acha razoável um numeroso grupo de famílias
enfrentando pessoas armadas, ordens de reintegração e policiais? Lutam para
serem iguais, com saúde, crianças na escola, direitos e mais direitos.
Mas também não
quero (acredito que ninguém quer!) ver outros seres humanos morando em praças,
em faixas de domínio, na rua, sujeitos a toda forma de violência. Quando não
organizados nos Movimentos Rurais, acabam ocupando as favelas das cidades,
passando todo tipo de necessidade, fome e miséria. Há ainda os que se entregam
às drogas, ao crime ou se humilham ao troco de esmolas.
Meus amigos pensem bem! O que você
faria se tivesse numa situação tão caótica, sem terra, sem saúde básica, com
uma escola ruim para os seus filhos, sem emprego, não sabendo o que fazer no
dia de amanhã, vendo seus filhos e sua família numa situação de
marginalização??? Um certo amigo disse-me que não suportaria ver o filho
passando necessidade! E alguém suporta ver pessoas, que gostamos tanto,
sofrendo?
Não vou basear
meus argumentos em acusações aos líderes dos sem terras ou em factóides. Eu garanto que a
maioria de meus colegas de trabalho pensa na paz social; na solução pacífica
dos conflitos; na solução em que a VIDA
esteja acima de tudo.
A nossa
Presidente deve liderar a Reforma Agrária e em tempo curto. Deve negociar com o
judiciário, através de seus órgãos e do CNJ a construção de metas de
julgamento; deve agilizar as Reformas e dinamizar a atuação do Incra; deve
prestar contas à população e chancelar a transparência dessas atividades aos
Movimentos Rurais interessados.
A Constituição
Federal de 1988 é uma lei belíssima! Se a propriedade foi escrita neste texto
para garantir os interesses da bancada dos grandes ruralistas, deve-se lembrar
da máxima de que a lei não tem dono e, uma vez saindo do Legislativo, pode ser
interpretada de acordo com os princípios. Assim, se os trabalhadores sem terra
não tiveram representantes na Assembléia Constituinte, isto não quer dizer que
os seus direitos não possam ser devidamente assegurados, afinal “TODOS SÃO IGUAIS!”
A vida é para
ser vivida em paz e com amor! Não acredito que vamos continuar excluindo nossos
companheiros de jornada, cegos por um sistema econômico, criado por nós mesmos,
que valoriza o nosso pior lado: o egoísmo, a soberba e a inveja. A terra produz
trabalho e isto é riqueza!
Os filhos dos
tantos “Josés” e “Marias” nascem sem terra alguma, enquanto que o filho do
barão moderno vem ao mundo rico de berço, com terras abundantes, do tamanho de
cidades. Há alguma lógica racional ou cristã nisto?
Se existem
ocupações e conflitos é porque não se está distribuindo as terras e ainda
quando acontece, não se é em prazo curto. Vamos dividir o que temos, ainda mais
quando se tem de sobra e abundância: terra!
“Ocupar, resistir e conquistar”! Este
não é um lema apenas de sem terra e sim de toda mulher e homem de bem que reconhece
que só a luta muda a vida e que apenas a luta dos trabalhadores de todo o país
faz acontecer.
Ah! A propósito do título deste texto,
pense bem: Todos são iguais!!! (não
mais uma pergunta, mas sim uma afirmação).
Antônio José de Carvalho Araújo
Juiz Federal e Professor de Direito
Constitucional
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