Por Drauzio Varella
A metade dos brasileiros adultos está obesa ou com excesso de peso. A
continuarmos nesse passo, em dez anos estaremos tão gordos como os
americanos. Lá, 30% dos adultos estão na faixa do excesso de peso, 30%
são obesos e 10% -sofrem de obesidade grave.
Para eles, conter essa epidemia virou prioridade governamental,
porque os custos das doenças crônicas associadas à obesidade serão
insuportáveis para o sistema de saúde. Imaginem para o nosso.
As autoridades sanitárias americanas -travam uma queda de braço desigual com a indústria alimentícia, as cadeias de fast-food, as associações que representam os restaurantes, as empresas de publicidade e os lobistas.
Está na ordem do dia a proposta do aumento de
impostos sobre os refrigerantes açucarados. Como essa discussão será
travada um dia entre nós – quando a saúde pública for levada a sério
nessas paragens –, vou resumir um debate publicado no The New England Journal of Medicine.
Para escrever a favor da taxação, a revista convidou o médico Thomas Farley, do Departamento de Saúde de Nova York. Diz ele:
1) As companhias fazem de tudo para promover o consumo de
refrigerantes calóricos. O apelo toma partido da preferência do paladar
pelos sabores doces.
2) As embalagens estão cada vez maiores e baratas, e podem ser
fechadas novamente para garantir consumo contínuo. São vendidas em
máquinas e distribuídas nas estantes mais vistosas de supermercados e
lojas de conveniência.
3) A população continua a engordar, apesar de saber que calorias em
excesso são as principais responsáveis do sofrimento causado pela
obesidade. O apelo dos refrigerantes com açúcar e das técnicas de
marketing para promovê-los é mais forte do que a força de vontade dos
adultos. O que esperar das crianças?
4) Se um produto distribuído nas escolas causasse doença, todos
pressionariam as autoridades para regulamentá-lo. Por que não fazer o
mesmo com os refrigerantes que contribuem para a obesidade?
5) A educação sempre é apresentada como alternativa às políticas
aplicadas à solução dos problemas de saúde. De fato, é necessário
alertar para os riscos das bebidas e dos alimentos obesogênicos, mas a
educação sozinha não resolve. É fundamental criar um ambiente alimentar
que não exponha crianças e adultos às quantidades absurdas de açúcar.
Contra a taxação, argumentam David Just e Brian Wansink, economistas da Universidade Cornell:
1) Não há dúvida de que os refrigerantes com açúcar contribuem para a
obesidade, especialmente nas crianças. Nesse caso, regulamentar preço,
conteúdo, disponibilidade e marketing parece sensato: se criarmos uma
lei que proíba
as crianças de tomar refrigerantes, elas não tomarão. Mas é preciso cuidado, a proibição do álcool no passado foi um desastre.
2) Cercear o acesso a um produto altera o padrão de consumo de
outros. Se afastarmos os refrigerantes das crianças, elas tomarão outras
bebidas; sucos adocicados, por exemplo. No estudo que acabou conhecido
como Coke to Coors conduzido em Utica, no estado de Nova York, a taxação
de refrigerantes provocou aumento na venda de cerveja.
3) Quando uma autoridade impõe regras dietéticas para as crianças, a
tendência delas é contestá-las. Será triste criarmos uma geração de
fanáticos por refrigerantes.
4) O uso de estratégias comportamentais é mais eficaz. Diminuir a
visibilidade dos refrigerantes com açúcar e aumentar a das frutas e dos
vegetais, tornando-os mais atrativos por meio de associação com heróis,
como Batman – como foi feito no passado com Popeye e o espinafre –, pode
criar hábitos saudáveis mais duradouros sem criar associações de
defensores do direito de tomar refrigerantes.
5) O universo de alimentos que contribuem para a obesidade infantil é muito maior do que o dos refrigerantes com açúcar.
E você, prezado leitor, o que acha?
http://www.cartacapital.com.br/saude/inimigo-publico/
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